1. O quarto mudo. Por Mileni Emy Takara e Marina Guitti (contadoras de historias), turmas XLV e XLVII

O silêncio predominava na noite fria do hospital, mas meu coração gritava... Era o primeiro dia que eu contaria uma história. Andávamos pelo corredor procurando alguém que quisesse nos ouvir; vimos Seu José Carlos sozinho, quieto, deitado na cama. Entramos e nos apresentamos, porém, José Carlos, aflito, colocava sua mão atrás da orelha, como se não conseguisse ouvir nada. Tentamos novamente, agora, um pouco mais alto. Ele, novamente, ainda mais aflito, fez sinal que não ouvia nada. Seu José Carlos também não falava: ele tinha uma traqueostomia. Trememos. Como contaríamos uma história? Até que vimos um caderno e uma caneta, logo ali, ao lado de sua cama. Escrevemos uma mensagem, sobre ouvir nosso coração; muitas vezes, ele nos dá todas as respostas de nossos problemas e um motivo para sorrir. O seu José Carlos segurou o caderno e, apesar de sua dificuldade para enxergar- um de seus olhos era de vidro- leu cada palavra atentamente. Foi então que o quarto, aparentemente mudo, tornou-se muito especial. Seus olhos brilharam de alegria e encheram-se de lágrimas. Após terminar sua leitura, Seu José Carlos insistentemente tentava arrancar aquela mensagem do caderno e nós, que entendíamos pouco, achávamos que ele queria nos devolver a mensagem e, por isso, falávamos que aquilo era um presente (singelo) nosso pra ele. Até que ele, finalmente, arrancou a folha. Nós olhamos uma para outra, suspiramos e pensamos.. "Bom, fazer o que né?!". Porém, ao contrário do que esperávamos, José Carlos nos surpreendeu; ele segurou aquela mensagem firme em suas mãos, levou ao peito e depois disse com gestos, "Vou pendurar na parede". Ele queria aquela mensagem ainda mais perto dele. Seus olhos estavam emaranhados e os nossos também; abriu um grande sorriso, olhou para o céu e apertou bem forte as nossas mãos: "Que Deus abençoe vocês", dizia ele só com a boca. Não precisou de nenhuma palavra, de nenhuma história, apenas de olhares, alguns sorrisos e uns minutinhos de silêncio para o quarto mudo explodir nosso coração!
2. Uma família de super- heróis. Por Mariana Rigolo (clown), estudante de medicina, turma XLV

Hoje conheci um super-herói. Não, um não, conheci cinco super-heróis. Uma família de heróis que em poucas horas pode me ensinar o significado de cumplicidade, carinho e força. Uma força tão grande que era possível sentir sua energia no ambiente. Cantamos, dançamos, contamos histórias, escutamos e nos entregamos. Afinal, essa é a grande arte do encontro, não é mesmo? É essa troca de energia, essa entrega que no final do dia te faz ter a certeza de que está no caminho certo. Aqueles que me conhecem sabe que eu costumo dizer e realmente acredito que Deus coloca as coisas no nosso caminho por um motivo, e hoje não foi diferente. Deus colocou essa família no meu caminho para que eu pudesse crescer, aprender e compartilhar. Compartilhamos momentos, trocamos energia. Ah... cada sorriso, cada lágrima de emoção, cada gota de suor, cada música cantada, momentos que ficarão guardados para sempre na minha alma. Hoje vivi mais um dia incrível de Sorrir é Viver, mais uma pedrinha das muitas pedrinhas preciosas que encontrei no meu caminho e guardei. Guardei no coração, ao lado de todos os pacientes com quem já tive a honra de atuar. Guardei porque são eles que me ensinaram o que de melhor vou poder oferecer na minha profissão: a humanização. Os estudiosos da palhaçaria dizem que o nariz é a menor máscara do mundo, mas eu particularmente acredito que o nariz é a menor porta do mundo. Ele realça aquilo que você faz uma forcinha para esconder, aquele defeitinho que você tenta esconder ou aquele lado seu que quase ninguém conhece. Ele é uma portinha pra sua alma, para o seu interior. E uma portinha para a alma de cada paciente. Aprendi nesse meu caminho que cada alma que eu cruzo é um aprendizado e um presente. Presentinhos que levo comigo e que sempre vou levar. Queridos heróis com quem eu cruzo nos hospitais, ambulatórios e até mesmo em suas casas, hoje gostaria de agradecer. Agradecer pela oportunidade de ter vivenciado momentos tão incríveis. Aqui fica o meu muito obrigada por me receberem sempre com o coração aberto e me ensinarem o que de melhor poderia aprender nessa trajetória louca da vida. Afinal, somos todos: "gente que acredita que Sorrir é Viver".
3. O quarto roxo. Por Caroline Reche, Heloísa e Tiago Bertolacini (clowns), estudantes de medicina, turma XLV
Tinha tudo pra ser apenas mais um quarto. Num dia chuvoso, quase todos os pacientes queriam dormir e até Margô se perguntava onde teria uma caminha vazia pra ela tirar um cochilo. As horas passavam, a chuva aumentava e quase ninguém queria conversar. O dia até parecia triste, ir embora era a melhor escolha. Mas como num impulso, Zé Pamonha e Bernardete se olharam e decidiram entrar no último quarto, o último do corredor. O quarto parecia meio agitado, afinal era hora de visita. Dona Cidinha logo levou um susto: - Mas que nariz vermelho é esse meu rapaz? Zé logo tratou de esclarecer que o nariz dele era assim mesmo, nada de resfriados, nada de rinite. Margô, então, notou um detalhe muito importante e falou: - dona Cidinha, é impressão minha ou a senhora gosta muito de roxo? - Gostar? Eu amo roxo! Percebemos. Camiseta, tênis, presilha.. tudo, absolutamente tudo era roxo. - E sabe de uma coisa - completa o marido - onde ela trabalha todos usam roxo por causa dela. - Mas por quê roxo dona Cidinha? - Eu amo roxo, pra mim é a cor da esperança. Bernardete notou que no leito ao lado, uma moça se divertia ouvindo essa história. - E o que você tem de roxo aí moça? Ela então responde, dando gargalhadas: - Além do roxo do braço? Ahh, serve a meia e a coberta? O tempo passou entre conversas e risadas. A cada momento, era possível enxergar que apesar das diferenças, todos estavam lá com um único sentimento: esperança. E se o dia parece triste e nublado, dona Cidinha e Mariana nos fazem acreditar que Sorrir é sempre a melhor escolha.
4. Humanos também choram e não precisam estar sempre cheios para serem belos. Por Paola Mortean (contadora de histórias), estudante de Medicina- Turma XLVII

"Sol e Lua se apaixonaram sem saber que a criação dos dias e das noites iria tentar separar seus olhares. Mas Deus criou as estrelas para que conversassem com ela e estivessem sempre por perto para o que ela precisasse. Mas mesmo na companhia das novas estrelas, a saudade insistia em apertar. Assim, Deus, na sua eterna bondade, criou o eclipse para que mesmo em um momento tão isolado, porém simplesmente único, o deitar do sol sobre a lua fizesse com que ela esquecesse de toda a tristeza e problemas que enfrentava, afinal ela não precisa ser sempre cheia para ser bela, sua fase minguante é completamente natural e sempre haveria de ter uma lua nova após um dia de tormentas. Foi com meu conto preferido, simplesmente por escolha da intuição, que me apeguei a Dona Lili ontem no hospital, minha história simplesmente a escolheu. Em um dia tão especial, em que contadoras e musicantes foram atuar em conjunto no HMU, um dia que eu precisava de uma energia diferente, Dona Lili me encantou com seu olhar atento e sua vontade de superar todos os problemas os quais a doença vem sujeitando-a. Ela me ensinou que mesmo minguante é possível ser feliz, porque um dia (é, esse dia sempre chega) 'você vai rir, sem perceber, felicidade é só questão de ser, quando chover, deixar molhar, pra receber o sol quando voltar. Melhor viver, meu bem, pois há um lugar em que o sol brilha pra você.' Obrigada, Dona Lili, seu brilho ainda iluminará muito por aí!"
5. Uma tentativa poética de explicar o porquê! Motivos que me levam a acreditar no Sorrir É Viver, por Vanessa Castro, Professora da vertente Contadores de Histórias

Meu nome é Vanessa Castro , sou contadora de histórias por opção e vocação! Desde 2012, tenho a honra de ser a orientadora-professora-facilitadora-parceira na linguagem sobre A Arte de Contar Histórias do Sorrir é Viver. E me pediram para escrever sobre a importância deste projeto e por qual motivo resolvi participar dele. E você, querido leitor, ao ler esse meu texto pode ser que o ache datado, pois as palavras que agora jorram do meu coração estão entrelaçadas na dor que me deparei ao acordar hoje e saber do acidente aéreo vitimando grande parte dos integrantes do time da Chapecoense, de jornalistas e tripulantes do avião. Olho a tela do meu notebook e diante desta imensa tragédia, um emaranhado de sentimentos-memórias instalou-se em minha alma. E em um paralelo entre o presente e o passado vivenciei o ontem e o agora. Sentada aqui, lembrei-me da primeira vez que estive no Hospital Anchieta (um dos hospitais visitados pelos estudantes de medicina-contadores de histórias e ainda como pretendente à vaga de professora dessa vertente), com o coração cheio de dúvidas se era esse o caminho que deveria seguir, se deveria firmar cada vez mais meus pés-alma-coração nas histórias entre Médicos, Pacientes e Hospitais. Ali pude constatar o pulsar de vida que acontecia nos leitos entre os pacientes e os contadores de histórias Sempre acreditei que contar histórias é uma ação própria do ser humano, nascemos dentro de uma história que se emenda em outra e outra e assim caminhamos. Porém, ainda ficava a dúvida! Em Hospitais? Estudantes de Medicina? Vendo agora o olhar de um médico ao chegar no local do acidente, penso na importância da formação humana desses profissionais. Formação que deve ir além de questões acadêmicas e operacionais. Além da sutura perfeita, do diagnóstico certeiro, do saber operar sob pressão, do minuto tênue que separa a Vida da Morte. Sim, tudo isso também é extremamente importante! Contudo, é necessário o ENCONTRO! E Contar Histórias é exatamente isso! Como diz, Fabiana Rubira, uma grande amiga: “Caminhar com as histórias é nunca estar só!” Contar e ouvir histórias tem um poder humanizador profundo! É a ressignificação de ensinar e aprender, de ouvir e diagnosticar, de torcer, de chorar e também de sofrer – porque médico sofre, viu?! E como sofre! Só que ele guarda para si e por isso CONTAR HISTÓRIAS é tão importante, pois é o encontro, o DIÁLOGO até mesmo para entender os porquês de tudo – ou até não entender nada! E assim, como os Médicos que estão lutando em busca da Vida que ainda pulsa naquela nave estraçalhada, nós aqui do Sorrir é Viver cada vez que adentramos em um quarto e contamos histórias compartilhamos a semente da Esperança, de que é necessário acreditar que Amanhã o Sol irá raiar, de que tudo irá melhorar, que as histórias nos ajudarão a cicatrizar a ferida (e eu piamente acredito que Sim! Por mais, que hoje a dor seja imensa!) E essa é a importância desse projeto na minha existência e na de milhares de pessoas que tiveram contato com eles; é este o motivo que me faz vibrar a cada aula dada, a cada turma formada, pois a VIDA, por vezes, faz um grande e enorme esforço para seguir adiante. Entretanto, ela recupera as forças e torna a florescer em SORRISOS. Afinal de contas, SORRIR É VIVER! Vanessa Castro, ou seja Eu, é pesquisadora da narrativa oral, contadora de histórias, atriz, arte-educadora e radialista. Este texto foi escrito na manhã de 29/11/2016.
6. Josés, Marias, Antônios, Rosas. Por Guilherme Bonadia (clown), médico, Turma XLI

Pacientes são o centro do que é o Sorrir é Viver, e sem eles nada do que fazemos teria sentido. Eles precisam do cuidado que está além do físico, do fisiológico: necessitam de cuidado da alma. Precisam sim dos pequenos detalhes, das nuances de uma nota musical no tom certo, de uma palavra bem colocada em uma história, de um sorriso sincero por trás de um nariz vermelho. O Sorrir é uma das muitas ferramentas existentes para o contato com o paciente, e que diferença isso faz! No dia-a-dia do médico, pequenas ações e gestos podem mudar uma consulta, uma aproximação com um paciente. Podemos (e somos) ferramentas de transformação, e devemos sempre nos lembrar que lidamos com o material mais delicado que há: o ser humano. O Sorrir me fez enxergar além do que estava a minha frente, e me fez observar os pequenos detalhes, que fazem toda a diferença. Uma luva de procedimento se transforma em um balão; um palito, em uma espada; e uma luz, em uma lanterna de explorador. Pequenas ações, grandes sonhos. E disso é feito o Sorrir é Viver.
7. O que o Sorrir significa para você?. Por Mariana Geraldo, médica, turma XLIII

No momento em que decidi que queria fazer medicina, 9 anos atrás, me perguntaram o porquê dessa escolha. Minha resposta era sempre a mesma: eu era apaixonada pelo funcionamento do corpo humano. Quando finalmente entrei na faculdade, pude conhecer mais daquilo que tanto me fascinava. E achava que minha admiração pararia por aí. O Sorrir é Viver me apresentou a uma forma diferente de olhar pra prática médica. Aprendi a ver as pessoas, seus olhos, sorriso e coração. Aprendi que um abraço ou uma palavra de conforto são muito mais valiosos do que um diagnóstico ou um tratamento. Que muitas vezes, os pacientes apenas querem ser ouvidos. E que muitas outras, precisavam apenas esquecer, nem que por alguns minutos, a sua condição. Hoje, meu discurso mudou. Obrigada, Sorrir é Viver, por me permitir descobrir minha real paixão dentro da medicina: AS PESSOAS!
8. Valores Intangíveis. Por Alana Degaspari (musicante), estudante de medicina, turma XLVII

Ontem voltei àquela velha reflexão: "Quais são, realmente, os problemas da nossa vida?"; mas, dessa vez, de uma forma tão concreta e intensa. Parei pra pensar qual seria o meu posicionamento em relação à vida se eu, de repente, me encontrasse com alguma deficiência ou qualquer coisa que me incapacitasse minimamente. Quão grande seria a minha força ? Eu conseguiria manter minha alegria?... Ontem conheci a concretização disso. Ontem conheci uma "Super-Família Super-Boa" que me mostrou, da forma mais cativante e envolvente possível, que o amor vence qualquer dor. Que a felicidade pode se fazer presente, a cada segundo e a cada suspiro, ainda que se tenha alguma deficiência (deficiência?). Que as lágrimas ao ver um sorriso sincero, sendo a maior e melhor forma de expressão, de um filho podem sim ser muito mais frequentes do que uma lágrima de tristeza. Que, quando se tem o amor, a fé e o cuidado, é sim possível continuar Sorrindo e Vivendo, a partir das adversidades. Foi em meio a esses tantos aprendizados que me vi de mãos atadas; podendo só agradecer. Agradecer a Deus por colocar Super-Famílias em meu caminho. Agradecer por fazer de mim, junto ao meu violão (mera ferramente de abordagem) instrumentos de alegria ao próximo; mas, ainda mais, um caminho de aprendizado a mim mesma. E pedir a Ele que eu consiga guardar em minha alma cada energia boa e cada história deixada por esses seres especiais que cruzam e cruzarão meu caminho. E, Enquanto eu conseguir guardá-las, seguirei Sorrindo e Vivendo. Fernandinho e sua Super-Família marcaram meu coração.
9. O que o Sorrir significa para você?. Por Thaiane Fagundes, médica, turma XLIII

Um olhar pode fazer milagres. É claro que não é qualquer vislumbre que tem esse poder. Um olhar, para ter mágica, tem que ser de verdade, daqueles que penetram a alma do outro e transmitem energia, fé e compreensão. Um olhar bem dado conecta pessoas que não se conhecem, é como compartilhar um pedacinho da sua luz com alguém. O Sorrir é Viver tem essa mania, que não tem nada de boba, muito pelo contrário, é um jeitão esperto de levar o amor e em troca recebê-lo também. Se você acha que para ter esse poder mágico do olhar é preciso estar equipada de um nariz vermelho, uma boa história ou notas musicais, está muito enganado... O olhar é um dom inerente à todos que tem um coração. Tente sorrir com olhos pra alguém e ver a magia acontecer.
10. O que o Sorrir significa para você?. Por Gabriela Mendes (contadora de historias), médica, Turma XLIII

Meu primeiro contato com o Sorrir é Viver foi na organização do primeiro Mutirão da Alegria. Fiquei encantada! A ideia de ir nos hospitais de um jeito " sem ser médico", ter um contato com os pacientes mais de perto e de um jeito diferente, era incrível. Algumas amigas minhas estavam no curso do Sorrir é Viver para contadoras de histórias, foi quando comecei a ter mais contato com o curso e ver como era. Me identifiquei muito! Sempre fui uma criança que amava escutar histórias, fazer isso no hospital e levar os pacientes para um lugar distante dali, onde quer que eles imaginassem, era único. Talvez uma das melhores maneiras para eles passarem o tempo e enxergarem com outros olhos o que estavam passando. E para mim também, um dos melhores jeitos de ver o hospital de um modo diferente. Ano passado foi quando comecei o internato. Você percebe que na correria do dia-a-dia, não se tem tempo de falar com os pacientes como você falava quando contava histórias, e sente falta. Eu não conseguia me preparar para contar uma longa história, mas dava um jeito de conversar com eles. Tentava pegar alguns dos pacientes que tinha mais contato para aparecer lá quando tudo estivesse mais calmo e conversar. Conversava sobre o que eles tivessem vontade...e eles têm muita vontade de falar! E conversar! E é incrível e engraçado perceber o que se passa em cada cabecinha, o que cada um acredita, os planos e sonhos. Nunca me esqueço da Dona Gercina. Eu a conheci quando estava passando no ciclo de cirurgia. Ela havia feito colostomia e então, não era tudo que ela podia comer. Dona Gercina amava sorvete! Sorvete de limão. Teve um dia que durante a visita dos médicos, ela tinha melhorado muito, e o Dr. Corsi falou que ela poderia tomar um sorvete. Mas só um! Dona Gercina ficou muito feliz! Sai do hospital e fui no restaurante da frente comprar um picolé de limão. Quando cheguei para dar o sorvete, ela mal podia acreditar! É quando acontecem essas coisas que o dia-a-dia te lembra de valorizar as coisas simples, que são as melhores. Contar história durante alguns anos da faculdade me ensinou a não esquecer de prestar atenção nessas pequenas coisas. Me ensinou a sempre lembrar que são esses detalhes que enchem os olhos de brilho, te lembram o porque de você escolher aquilo e estar ali.
11. O que o Sorrir significa para você?. Por Edgar Sasaki- Smeagol (clown), médico, Turma XXXVI

Como foi minha experiência no Sorrir é Viver? Existem muitos acontecimentos que ocorrem em nossa vida. A maioria são esquecidas, muitas viram lembranças, algumas nos marcam e poucas deixam marcas profundas. O Sorrir é Viver é algo que levarei para o resto da vida. O engraçado é que entrei no Sorrir é Viver quase que se querer... Fui participar do processo seletivo pois queria entender como o ato de ir de palhaço no hospital poderia influenciar positivamente a minha formação médica. Durante a seleção, em um determinado momento da explicação do que era o então Projeto, que futuramente viraria uma ONG, ouvi alguém falar: “Só fica aqui quem levar a sério o Projeto!”. Nesse momento eu me levantei e comecei a caminhar em direção a porta. Oras! Como eu poderia garantir minha participação se eu não sabia se isso acrescentaria algo a mim? Em seguida ouvi dizerem: “Smeagol! Você fica, né!”. Resolvi ver para crer. Dei meia-volta e sentei na cadeira onde estava! Rs! Se valeu a pena ficar? Bom... eu participo de um jeito ou de outro até hoje. Aprendi muito com essa experiência. De diversas formas. As vezes com um olhar, outras com um gesto, algumas conversando com alguém... mas principalmente escutando. É algo que tento levar não só para minha vida de médico... mas para a minha vida como um todo.
12. Nem todo contador conta uma história. Por Jéssica Locaspi, Bárbara Miranda e Cecília Alvo (contadoras de histórias), estudantes de medicina, turma XLV

Tiramos a poeira das nossas maletas depois das férias e passamos pelos corredores do hospital com o mesmo frio na barriga do primeiro dia que atuamos. ”Vamos entrar neste quarto, ele está sozinho.” Acabamos contando a história de dois amigos internados num hospital, o seu João e seu Manoel justamente para um paciente chamado João que desejava encontrar um Manoel para distrair seus dias tediosos internado. No quarto seguinte, contamos a história de um homem corajoso que enfrentou um lago de jacarés para alcançar seus objetivos. E qual foi nossa surpresa ao encontrar um verdadeiro caçador de jacarés ali, pessoalmente??? Mas as vezes o melhor fica para o final. No último quarto, escuro, conhecemos a Maria Selma. Uma mulher que a princípio parecia abatida, cansada, mas concordou em ouvir nossas histórias. Contamos. Depois, ela nos disse que gostava muito de histórias e que inclusive estava escrevendo algumas, que concordou em nos mostrar. Ficamos conhecendo a história de um menino que queria ser preguiçoso como o cachorro e a história ainda incompleta de um ovo, uma tartaruga e um pato. E uma animação começou a surgir naquele quarto, que deixou de ser tão escuro. Pacientes, pacientes! Pacientes são seres humanos e sempre hão de preencher esses vãos que a pura medicina deixa. Ali ficam nas nossas lacunas um pouco de cada rosto simpático, de cada história que ouvimos, de cada seu João, caçador de jacarés e Maria Selma.
13. Coincidências ou não? Por Mileni Emy Takara e Thais Suelloto (contadoras de histórias), estudantes de medicina, Turma XLV
Era um dia aparentemente normal no hospital, mas para seu Júlio, não. Desde que chegou, ficou mais amuado, triste e desperançoso. Inúmeros exames a se fazer, muitas dores e nenhum diagnóstico até aquele momento. Entramos no quarto e ele ali, afundado em seu cobertor, acompanhado por seu genro, o Seu Oliveira, sorridente, confiante e alegre. Perguntamos se os dois gostariam de ouvir uma história e eles disseram que sim. Contamos a história das pedras que viraram diamantes; o seu Oliveira, aproveitando a nossa história, engatou uma história também de pedrinhas e nos ensinou que uma pedra é sempre uma pedra, mas cada um pode aproveita-las de diferentes formas. Já o seu Júlio, sorria de vez em quando, mas falava baixinho e, às vezes, até incompreensível, engasgava em suas próprias palavras. Contou uma charada e depois de uns bons minutos de conversa, ele disse que uma das hipóteses de sua doença era pedra na vesícula. Brincamos se essa pedra não era um diamante e os dois ficaram ali imaginando o que fariam se realmente saísse um diamante do Seu Júlio... Já nós ficamos pensando quem é que tinha soprado no nosso ouvido que eles precisavam ouvir a história das pedrinhas que viram diamantes.
14. O que o Sorrir significa para você? Por Vitor Mauad (clown), médico, turma XLV

Vamos contar histórias? Era uma vez um menino, um menino como qualquer outro, bem, quase. Esse menino gostava de hospitais, seus pais, médicos, o levavam as vezes. As enfermeiras o conheciam, as vezes vinham visita-lo até. Geralmente levavam um pouquinho de sangue quando vinham mas ei, era por uma boa causa. Outras vezes, seu pai lhe dava uma injeção de força, soldadinhos ele dizia, para que o corpo do menino ficasse mais forte, e ei, porque não? E assim, o menino, desde muito cedo, aprendeu a gostar do hospital, e aprendeu admirando seu pai, o que significava ser médico. Assim, quando lá pelos seus 14 anos, o menino, que dedicava seu tempo a pinturas em tela e desenhos de papel – além de uma dose provavelmente pouco recomendável de jogos de computador - decidiu ser médico. Quando ele tomou essa decisão, e falou para seus pais nem tão depois, eles gostaram da ideia. Seu pai começou a lhe contar as coisas do hospital. Contava de um garoto, paciente dele, com uma doença do sangue meio grave, que estava triste um dia, e recebeu de seu médico um presente, uma carta, agora veja, podia ser qualquer carta. Ele escolhia a carta, e seu médico iria adivinhar que carta era. O garoto assim o fez, e a carta, que coisa, depois de devolvida as mãos do médico, sumiu! Foi aparecer sabe onde? Ao lado de um barco de brinquedo lá no fundo do quarto! E com essa história, o menino do nosso conto começava a entender o que significava ser médico. Aos 18 anos, ele entrava na faculdade de medicina. Havia passado em uma escola da qual pouco havia ouvido falar, em uma cidade muito maior do que estava acostumado, com pessoas estranhas, mas ei, vamos lá, a vida é uma aventura certo? Poderia ser interessante! E quão interessante foi aquele primeiro dia.... Em meio a aulas meio malucas entram uns caras estranhos, palhaços, apresentando um jornal, a la jornal nacional mesmo, e ali estavam pessoas que, como ele, haviam escolhido ser médicos, e que já tinham anos a mais a frente do garoto. E que coisa, eles eram palhaços também? Ok, o nosso personagem já havia visto Patch Adams, era algo bacana, ele conhecia as historias dos Drs da Alegria, projeto invejável, mas aquilo era diferente. Aqueles eram alunos de medicina, junto com medicina aprendendo a ser palhaços. Uma certa carta em um barco veio a mente. Nosso personagem tinha uma mente inquieta, queria saber mais do que era aquilo, queria estudar, e assim o fez. No segundo ano da faculdade se juntou a um grupo de pessoas e foram a pesquisa! Nada melhor que beber direto da fonte certo? E porque não? La foram eles conversar com os fundadores, os idealizadores, afinal, que tipo de pessoa pensa em por um nariz de palhaço em um futuro médico? Ali abria-se a porta de um novo mundo, porque veja, medicina é muito mais que livros e revistas com nomes difícieis. A técnica da medicina nos leva a acompanhar um paciente em suas doenças, trata-lo quando possível, alivia-lo sempre, e falar um monte de palavras quase gregas em jargões incompreensíveis ao ponto que nossas conversas com nossos colegas são praticamente restritas de entendimento. Ser médico é muito mais do que isso! Ser médico é um bom dia, um sorriso no rosto. Ser médico é a responsabilidade de conhecer a ciência e a doença, e a humanidade de reconhecer a fragilidade e a força dentro de cada um de nós, seja o paciente, seja a família, seja o próprio médico. E por um nariz de palhaço é também reconhecer e explorar sua própria fragilidade. É se reconhecer em seus defeitos, fazer deles o ridículo e rir deles, e com eles. É tornar o paciente forte, mesmo quando ele está frágil, é se tornar frágil, para virar joguete. Ser palhaço é o exagero de se mostrar humano. E se lembrar humano é fundamental para se fazer médico. O médico tem o poder e a responsabilidade de tomar decisões que às vezes vão ditar a vida ou a morte, ao mesmo tempo que tem de conviver com suas imperfeiçoes, suas humanidades e seus defeitos quando toma essas decisões. Se lembrar humano é fundamental para não nos isolarmos nessas horas, para nos colocarmos no mesmo nível do paciente, não para tentar entende-lo, algo que jamais nos será possível, mas para poder ouvi-lo.